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VULGAR - UM UNIVERSO DE IMAGENS DE ANDRÉ MEDEIROS

Há 11 anos, André Medeiros Martins dava início ao seu projeto de fotografar pessoas nuas. Hoje, depois de clicar mais de 700 pessoas, publicar dois livros e realizar algumas experiências audiovisuais, o trabalho desse agitador das redes ganha mais espaço e adeptos.

Arte sobre fotos de André Medeiros

Recentemente, o ator e pornógrafo André Medeiros lançou, de forma independente, o livro VULGAR, um diálogo entre as suas fotografias e mais de 50 textos das áreas das Artes, Ciências Humanas e Educação. O livro mescla fotos de 190 pessoas com textos onde são abordadas questões sobre o corpo trans, negritude, pornografia, moda, gordofobia e HIV/AIDS. Escritos de Renata Carvalho, Janaína Leite, Carolina Bianchi, Estela Lapponi, Ronaldo Serruya, Bruna Kury, Fause Haten e Marcelo Denny fazem parte desse trabalho. A ideia é criar um catálogo editorial com fotos que provavelmente seriam descartadas de ensaios padrões. Aquelas em que só um olho do modelo está aberto, um clique solto entre uma pose e outra. Esses registros que seriam excluídos em ensaios habituais foram os escolhidos para as 370 páginas que compõem a obra, dialogando com o conceito de erro.


VULGAR também foi criado como um livro diálogo, onde o leitor possa ver as imagens e ler os textos de forma a criar outros diálogos sobre os assuntos abordados. Sem uma divisão hierárquica, contos pornográficos, posts de redes sociais e artigos acadêmicos coabitam a publicação entre nudez e conteúdo pornográfico.


Uma surpresa acompanha VULGAR. Dentro do livro está um pôster do Jogo Vulgar – tabuleiro feito a partir da vivência de 18 pessoas. O jogo foi criado para criar múltiplas experiências com os relatos e textos dos autores, sendo um ótimo propositor de temas para gerar mais empatia. O livro pode ser adquirido através do Instagram: @projetovulgar. Basta procurar pelo autor que os envios podem ser realizados para todo o país.


PENSA QUE ACABOU? AGORA É QUE COMEÇA...

Com experiência advinda do teatro, André Medeiros tem seu site mais de 800 ensaios fotográficos ou experimentos audiovisuais. Ele é também organizador do livro Flexões – um estudo sobre sexualidade plural e Vulgar, além de ser Diretor dos longas-metragens "Alfredo não Gosta de Despedida" e "Alfabeto Sexual".


Quando procurei por ele para uma entrevista, já conhecia um pouco sobre o Vulgar através de releases recebidos aqui pela redação. No entanto, o acesso ao conteúdo gerado pelo artista e agitador das redes tirou do prumo até este colunista que vos escreve. Como alguns conhecidos posaram para a lente e as retinas de André, é natural que, volta e meia, alguém compartilhe algo sobre o livro nas redes sociais - o que gera no espectador uma sensação de intimidade com o projeto. É essa sensação de intimidade que nos leva até o site de André. Na verdade, nem considero um site. É um portal para outro universo. Algo muito novo que abre janelas em nossa mente. Entendo que isso também seja proposital nessa obra/provocação que não se encerra por si só.

Em seu site, que mais parece uma câmara de galerias ocultas que necessitam ser exploradas, há diferentes linguagens, ensaios e desdobramentos. Digo isso porque pude perceber que um modelo que participa do Projeto Vulgar participa também de outros ensaios em situações diversas. É algo fluido, mas, ao mesmo tempo, não linear. Galerias como "Fora daquela casa", "1 Ano" (ou 365), "Perdoa-me por me traíres" e "Alfabetos" nos apresentam corpos, situações e sensações que nos fazem navegar por horas na internet. Não adianta buscar algo pra ver. Não adianta querer procurar o ensaio nu de um conhecido porque o formato aleatório faz com que tenhamos acesso aos mais variados corpos, fetiches e expressões antes de chegarmos até um objetivo.

Alguns ensaios eu já tinha visto pelo Instagram, mas com cortes estratégicos para que a rede não censurasse as publicações. Porém, no site, é tudo aberto. É como uma labirinto que te faz conhecer de maneira crua e poética a história por trás de cada ensaio, de cada foto. Há links diretos para outras plataformas, como o site de pornografia X Vídeos. E é lá que acontece a maior contravenção artística. Em meio às experiências eróticas amadoras de tantos usuários, há um canal de André Medeiros em que performance e sexo explícito caminham juntos, confundindo o olhar e a libido do internauta que, antes de querer entender o que se passa nos vídeos, assiste a tudo pela excentricidade e poesia de todo o conteúdo.


Confuso no primeiro momento, continuei a acessar mais vídeos e permaneci com uma sensação de que eu havia invadido um espaço que não era pra eu ter acessado. Vi uma série de transas musicadas por Matheus Campelo, outro provocador das redes que acompanho timidamente pelo celular. A sensação é a de que eu não pudesse ver conhecidos praticando sexo de maneira tão aberta. Conversei sobre isso com alguns amigos das artes visuais, das cênicas, tentando entender que linha de trabalho era aquela. Fiquei na paranoia de tentar entender se era videoperformance, se era uma contracultura invadindo um site pornô com arte pra desmistificar o ambiente. Caí na velha cilada de querer conceituar o que já estava bem claro diante de mim: cus, paus e gozos livres e musicados. E esse conjunto de elementos por sí só já responderia meus anseios por conceituação. Num dos vídeos, em meio ao coito, há uma narração de André explicando ao espectador que este não precisa ficar teorizando e encontrando uma explicação lógica. Era aquilo mesmo... Sexo! Fui afetado pelo o que vi e pelo que senti, gerando em mim questionamentos como homem e como artista. A partir daí passei a ver algumas coisas dele no Instagram sem saber ao certo como puxar papo, comentar ou dialogar sobre. E cá estamos... Cá estamos para uma matéria exclusiva com o responsável por esse misto de sensações.


COM A PALAVRA, ANDRÉ MEDEIROS MARTINS

André Medeiros

"Eu tenho 39 anos. Venho do teatro, sou ator há 22 anos. Essa história sobre sexualidade, fotografia eu já faço há 11 anos, até antes da ideia que a gente tem de nude, smartphone, redes sociais. Já experimentava na época do Orkut, quanto nem era tão cotidiano. Fui experimentando o encontro com as pessoas, o movimento com as pessoas no ato de fotografar e, claro, em qual plataforma isso ficaria: redes sociais, livro impresso, sites exclusivos, cinema alernativo, links de espaços pornográficos... Não é só a minha história, a minha ideia. Eu acho que a quantidade de pessoas que topam participar tem a ver com o meu foco. Eu sou meio que uma plataforma onde essas pessoas também cruzam suas próprias histórias", comenta André.


Quem trabalha com nudez artística sabe que em estúdio ou em ensaios abertos há toda uma preparação para que o clique esteja alinhado com a luz, com o conceito... No caso das experiências propostas por André, o importante é a relação com o modelo participante, conforme ele explica:


"Eu vi que quando as pessoas se despiam se colocavam na situação. Elas se colocavam em estado de vulnerabilidade, em estado de descoberta. Quando uma pessoa se coloca para ser fotografa nua ela se coloca em estado de experiência. E depois do material feito eu começo a experenciar em plataformas diferentes para ver o efeito que isso tem nesses lugares. Nesse período de pandemia, há ensaios que foram feitos à distância e ensaios feitos presencialmente. Tem que pensar que a nudez não é natural em nossa sociedade. A gente nasce e já tem que vestir uma roupa... Então não dá pra encarar o ato de estar nu pra tirar uma foto como algo totalmente natural. Não precisa ser sofrido, mas é estranho sim. E isso pra foto é ótimo! Se você é tímido, continue tímido... é aí que está a beleza".


Após a realização dos ensaios vem outra etapa igualmente importante: a difusão desse material. Engana-se quem pensa que cada um vai pra uma caixinha diferente. A ideia não é guardar em caixas... A ideia é pulverizar o resultado:


"Acho que todos os projetos que eu faço começam... Sei que começam! Para onde vão eu não sei... O desdobramento vem com o tempo. Atualmente eu coloco em meu instagram e no meu site. Algumas pessoas já falaram que meu site não tem a opção BUSCA. A ideia é essa. É pra dificultar. Não é pra você ver rapidinho. Pra vc ver a foto de alguém que vc quer, tem que, necessariamente, que passar por fotos de outras pessoas no meio do caminho. No Projeto 365 (um ensaio nu por dia), eu não encontro as pessoas para pensar numa determinada foto. A ideia é ter o encontro e ver que imagem, que provocação esse encontro sugere em formato de foto", esclarece.


O site de André não te prepara pra uma visita gradual, leve e com lógica cronológica. É como um Jogo da Vida (aquele jogo popular em década passadas) em que você joga um dado e vai caminhando pelas casinhas. Porém, no caso do site dele, no teu primeiro acesso já cai de cara com algo que as retinas não estavam preparadas pra ver. É como se pulasse da casa nº 1 para a casa nº50 de uma vez só. Sem aviso prévio. Você vai de uma fotografia singela de nudez artística para uma aba com sexo explícito com trilha sonora ao vivo. É forte... Forte, intenso e igualmente surpreendente.


Sobre a relação com os modelos durante a realização das fotos, Medeiros fala dos acordos pré-fotos:


"Quando a gente vai explorando e descobrindo o universo de cada um, a gente abre as possibilidades para novos universos. Uma amiga minha mesmo quis fazer o ensaio dela chorando. O tempo todo chorando. E fizemos! É muito do que o modelo quer... Eu dou um suporte ou outro, mas a experiência de quem posa é o principal objetivo."


A vida é isso. É um lugar não-linear. É o jogo de picos entre serenidade, ira, loucura e chá e camomila. Essa montanha-russa pode ser acessada pelos aventureiros cibernéticos que queiram conhecer melhor o que há por trás do endereço do site.


"O meu trabalho com pornografia é um outro caminho, que habita outro lugar. Se você pegar o projeto 365 eu sei que há vários tipos de ensaios... Ensaios mais eróticos, ensaios que parecem propaganda de cueca. E tá tudo bem. Tem esse incômodo meu em que eu vou produzindo as coisas. Eu nunca me preocupei se é arte ou não. Eu faço."

ANDRÉ MEDEIROS MARTINS

Para visitar o site, acesse o link: https://andremedeirosmartins.com/

Para visitar o Perfil do Projeto Vulgar e adquirir um exemplar do livro, acesse: @projetovulgar

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