Ele está marcando uma nova fase de "teatro pop" com crianças e adolescentes em Ceilândia. Numa brincadeira séria, divas e musos teens mostram seu talento começando a fazer teatro de uma maneira bem divertida. Por isso, precisamos falar de Jhony Gomantos!
Ator, professor e fundador da Gomantos Produções Artísticas, Jhony Gomantos tem em seu currículo bons anos de trajetória nos mais diferentes estilos teatrais. Formado na Faculdade de Artes Dulcina de Moraes, atuou em mais de 15 espetáculos. Como diretor, assinou mais de 22 obras.
A vida artística começou cedo, talvez até sem a consciência do que poderia vir a acontecer. Na época da escola, Jhony participou de um grupo estudantil de axé music que se apresentava ao som de hits dos anos 90 e, posteriormente, passou a trabalhar com o diretor Plínio Mosca, que lançou outros tantos artistas, como Gleide Firmino, Érika Guedes, Leonardo Flores e Rômulo Mendes (que já foi um dos personagens desta coluna).
Com o grupo de Plínio Mosca, Jhony teve sua primeira experiência internacional em participações no Festival Entepola Chile. Já na juventude, passou a ter curso de artes cênicas no ALUB, onde teve contato com a professora Silvia Paes. Logo depois, se tornou colega de Silvia no Teatro de Concreto, tradicional grupo de Brasília. É sabido que o Teatro do Concreto teve e tem um papel importante para a cena teatral brasiliense. Foi nesse contexto que ele atuou em diferentes espetáculos do grupo, como "Diário do Maldito" (2006), "Borboletas Têm Vida Curta" (2007) - "Inútil Canto e Inútil Pranto pelos Anjos Caídos" (Leitura Dramática de 2007), "Ruas Abertas (Intervenção Cênica de 2008), "Entrepartidas" (2010) e "Extraordinário" (2014).
No Teatro do Concreto, uma característica de seu trabalho é a densidade. Lá, atuou em espetáculos fortes, performáticos e com temas provocadores postos em cena. Dentre os trabalhos mais expressivos do ator no grupo, temos o "Diário o Maldito", onde interpretou Floquinho, um PM capacho da justiça, e "Entrepartidas", onde deu vida à Dama da Noite, personagem que transitava pelas ruas, becos, vielas e cemitérios das cidades por onde o grupo fez turnê. Vendo a trajetória do ator no contexto do Concreto, fica até difícil, à primeira vista, associar sua imagem a de um professor carismático que atualmente trabalha com muitas turmas de crianças em suas oficinas. Sobre isso falarei mais adiante...
Em 2008, o conheci enquanto ele estava super envolvido com os trabalhos do Teatro do Concreto. Fazíamos o mesmo curso de graduação na Faculdade de Artes Dulcina de Moraes. Ali, surgiu uma afinidade entre colegas que éramos, só que cada um em seu respectivo semestre. Curiosamente, eu já o conhecia das tantas e tantas sessões que assisti de "O Diário do Maldito", que, na época, era minha maior referência de bom espetáculo em Brasília. Eu tinha um trabalho de instalações na Faculdade Dulcina voltadas à questão da cultura de massa de anos 1980 e, numa dessas intervenções, ele puxou assunto sobre o trabalho que eu estava fazendo. Começou aí uma história nossa de amor e ódio embalada por citações de vilãs e mocinhas da teledramaturgia brasileira. Até hoje nos chamamos, carinhosa e ironicamente, de Ruth, Raquel, Isadora Venturini, Pilar Batista, Jacutinga, Nazaré Tedesco, Marieta Berdinazi, Marlene Mattos e Paquita Chernobyl... As personagens da TV estão sempre em nossos mais obscuros diálogos.
Pois bem. Nessa fase da faculdade (ainda em 2008), fizemos uma cena de "Beijo no asfalto", obra de Nelson Rodrigues, e a proposta deu muito certo. Em seguida, chamamos Tássia Aguiar para dirigir a cena, que se tornou um espetáculo profissional com a chegada de Paula Rejane no elenco. Esse encontro entre quatro jovens culminou na fundação da Cia. Fábrica de Teatro, companhia que se tornou referência em produção cultural em Brasília a partir de 2009. Hoje, nem Jhony, nem eu fazemos parte da Fábrica (ele saiu em 2010 e eu em 2017), mas levamos conosco boas lembranças dessa fase de nossas vidas.
Cada qual pro seu lado, mas sempre perto. Enquanto eu me aventurei por outros caminhos, Jhony participou de alguns espetáculos da cidade, como "Café com Torradas" (dirigido por Gisele Rodrigues), "Atores patéticos em busca de histórias poéticas (dirigido por Rodrigo Fischer) e "Sentimento Só" (onde ele dirigiu e atuou em Brasília e duas vezes no Chile). Volto um pouco em "Atores patéticos..." porque preciso dizer que ele interpretou uma personagem que era uma mistura de Heleninha Roitmann e Nazaré Tedesco! Isso mesmo, minha gente! Ele juntou duas personagens da atriz Renata Sorrah e fez uma licença poética no teatro. Sem comentários (rsrs).
A última montagem inédita de Jhony como ator foi no espetáculo "Quizila Coiffeur" (dirigido por Ana Flavia Garcia). A peça nasceu em 2016 e se manteve até 2017. Era uma boa chanchada que homenageava orixás através de personagens sócias num salão de beleza bem inusitado. Comédia das boas mesmo. Em, 2018, fez também uma longa turnê por estados do Brasil com o Teatro do Concreto.
Agora, deixando de lado a parte curricular, quero falar do Jhony Gomantos professor... Um professor de teatro que há mais de 10 anos oferece ao público infanto-juvenil oficinas teatrais de qualidade, sempre com montagem de espetáculos ao final. Pelas fotos se vê o esmero e a qualidade dos espetáculos que encantam toda uma geração de crianças e adolescentes de Ceilândia e Gama - onde são aplicados os cursos.
COMO FUNCIONAVA ANTES DA PANDEMIA:
As oficinas aconteciam nas unidades do SESC em duas cidades: Gama e Ceilândia. Como hoje havia muitas turmas, a Gomantos Produções Artísticas possui monitores e assistentes de direção para dar conta do recado. A esses assistente, Jhony dá o sugestivo nome de Paquitas e Paquitos (por que será, não é mesmo?!). Em 12 anos, mais de 500 crianças participaram de suas montagens e muitas hoje fazem faculdade de artes em Brasília ou até se formaram em outras profissões.
São apresentações megalomaníacas! Cenários e praticáveis gigantes, muita dança, lip sync, efeitos de iluminação, figurinos arrebatadores e até motocicleta colocada em cena! Os pais ficavam enlouquecidos, até porque visualmente é algo que provoca um espanto aos olhos. O grande sucesso que as oficinas têm se deve ao fato de tratar a criança como a criança merece ser tratada num processo teatral onde as referências da cultura pop e da cultura de massas dialogam diretamente com o que elas consomem. Se a Rihanna, Lady Gaga, Beyoncé, Katy Perry, Anita e outras divas pops fazem parte do universo dessa criança e desse adolescente, é justamente por esse caminho que a direção de Jhony segue, respeitando o que a juventude gosta e introduzindo a linguagem teatral num caminho onde a diversão e o aprendizado andam de mãos dadas. É um fofura de se ver. Para muitas crianças, é o primeiro contato com o teatro. E o que é melhor... dentro de um universo lúdico que aceita a criança como ela é e como ela tem vontade de expressar seus sentimentos.
Semanalmente, teasers, fotos e vídeos das aulas e das apresentações são disparados pela equipe da Gomantos nas redes sociais. É muito close, é muita luz, é muita energia vibrante com ares de megaprodução. E quando falo com ares de megaprodução, me refiro ao impacto visual do produto final apresentado num teatro de verdade (no caso, das unidades do SESC). O mais surpreendente, talvez, é constatar que tudo é feito artesanalmente, cuidadosamente e delicadamente. Costureiras, estilistas e demais contratações terceirizadas são, em sua maioria, de pessoas que moram em Ceilândia. Isso, além de nos servir de exemplo, serve também de incentivo à produção regional, à valorização da comunidade das periferias e à autoestima de todos que participam direta ou indiretamente do processo de montagem.
Quando eu brinco e cito acima os assistentes de Jhony chamados carinhosamente de Paquitos e Paquitas, tenho consciência de que, por mais que o título deles seja engraçado, estou falando de jovens que fizeram as oficinas dele, se destacaram, se interessaram pelos bastidores e que agora fazem parte da equipe de produção recebendo para isso.
COMO FUNCIONA DURANTE A PANDEMIA:
Nesse período em que os brasileiros estão de quarentena, em decorrência da Covid-19, as crianças já matriculadas nos cursos de Jhony estão tendo atendimento remoto através da internet. Para que o tempo seja aproveitado da melhor forma possível, novas pesquisas de futuros espetáculos estão sendo realizadas pelo diretor para que as crianças voltem à prática teatral quando a situação do país melhorar. Os pais também agradecem, pois a energia dos pequenos em casa precisa ser canalizada pra uma atividade lúdica, mesmo que seja pelo computador.
"Antes da pandemia, as oficinas tinham um tempo maior. Agora, eu sigo fazendo o trabalho de interpretação de texto, mas pensando na interação com as redes sociais. Como os adolescentes são muito conectados com o Instagram e Youtube, estou fazendo esse paralelo pra dialogar com o que se tem", comenta. O resultado desses treinos será disponibilizado nas redes para que os próprios educandos possam se assistir.
Outra coisa que Jhony fará é a elaboração de coreografias dos próximos espetáculos (Mamma Mia! e A Família Adams). Esse tutorial poderá ser feito e repassado aos participantes para que treinem a movimentação cênica em casa. Além disso, alguns artistas convidados farão aulas curtas para os participantes. Algo como uma pequeno tira-dúvidas para os jovens.
Entende agora o quanto isso é relevante para a cena cultural e social brasiliense? Se você é pai, mãe, tio, tia e tem um pimpolho querendo aprender arte, fique sabendo que em Ceilândia e no Gama tem oficina de teatro infantil de qualidade. Precisamos falar de Jhony Gomantos!
"Eu comecei a fazer teatro em Ceilândia. Eu era muito novo e, algumas vezes, ia para o Plano Piloto para fazer algumas oficinas. Comecei a vivenciar muitas coisas fora da cidade, tanto no Entepola Chile quanto nas turnês do Teatro do Concreto. Foram muitos grupos, muitos festivais. Isso acrescentou muito em meu trabalho e ano que vem já vai fazer 20 anos que faço teatro"
JHONY GOMANTOS
Comments