Gaúcha Graça Craidy mostra, no Memorial do Ministério Público do RS, a partir desta terça-feira (11/02), 30 obras selecionadas de quatro séries de sua autoria sobre a temática

Para marcar os dez anos de seu trabalho contínuo de denúncia da violência contra a mulher, a artista visual gaúcha Graça Craidy selecionou 30 obras de suas várias coleções sobre o tema e expõe a coletânea no Memorial do Ministério Público, em Porto Alegre. Sob o título “Meu bem, meu mal”, a abertura será nesta terça-feira (11/02), às 17h, e a visitação irá até 11 de março, mês em que se comemora o Dia Internacional da Mulher (8/3).
No dia 10 de março, Graça e as promotoras de Justiça Angela Caren Dal Pos e Ivana Machado Moraes Battaglin debaterão o tema em evento organizado pelo coordenador técnico do Memorial do Ministério Público, o historiador Gunter Axt. Ivana é coordenadora do Centro de Apoio Operacional de Enfrentamento à Violência contra a Mulher, do MP do estado.
De “Até que a morte nos separe” a “Livrai-nos do Mal”
As obras montadas no centenário casarão que abriga o Memorial do MP, no Centro Histórico da capital, pertencem às séries “Até que a morte nos separe”, pinturas a partir de fotos das cenas dos crimes publicadas em jornais; “Livrai-nos do Mal”, que aponta as violências referidas na Lei Maria da Penha; “Feminicidas, o machismo que mata”, na qual homens são representados com revólveres no lugar do pênis; e “Estupro”, que retrata abuso cometido por homens contra uma mulher.
A primeira exposição da artista sobre a violência contra a mulher aconteceu em 2015, quando suas obras da série “Até que a morte nos separe” foram selecionadas para o Salão de Artes do Atelier Livre Xico Stockinger, onde estudava desenho e pintura. Na época, também expôs, no Dia da Mulher, no Centro Cultural Zona Sul.
Reconhecimento do sistema de Justiça e da academia
A seguir, Graça expôs a mesma série sobre feminicídio em instituições interessadas em aprofundar o debate do tema, como Memorial do Palácio da Justiça, Memorial da Justiça Federal, Memorial do TRF-4, Assembleia Legislativa, Pinacoteca da Associação dos Juízes (Ajuris), Memorial do TCE, e também em universidades, como FURG, da cidade de Rio Grande, UFPR - Campo Mourão (online). Na UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), foi convidada especial e, com três obras suas, integrou exposição feminista de uma turma de formandos de Museologia.
A dedicação da artista ao tema inspirou trabalho acadêmico de aluna da disciplina de Projetos Especiais do curso de Artes Visuais do Instituto de Artes da UFRGS. Outro reconhecimento foi uma obra de Graça ilustrou a capa do livro A Lei Maria da Penha na Justiça, da desembargadora Maria Berenice Dias. Na mídia, por exemplo, quando a redação do ENEM abordou a questão da violência contra a mulher, em 2015, pinturas da artista ilustraram a capa e quatro páginas do caderno DOC, do jornal Zero Hora.

Explicando o termo feminicídio
"A palavra feminicídio ainda não era conhecida, tive que fazer um banner explicando o termo", lembra Graça. "Coloquei embaixo dos quadros a foto original da reportagem que inspirou a pintura, e o efeito foi devastador. Ao atinarem que aquele não era apenas o retrato de uma mulher dormindo, mas de uma mulher morta - e pior -, morta pelo marido ou pelo ex, as pessoas levavam um choque, queriam debater o assunto, entender o que se passava", relata.
"O assunto feminicídio passou das páginas policiais para o caderno de cultura. Em pouco tempo, expus mais de 10 vezes a mesma série. Todo mundo queria discutir feminicídio e, lamentavelmente, continua querendo, dado os números de feminicídio no Brasil, considerado hoje não mais apenas um caso de segurança, mas de saúde pública”, diz.
O nome da atual exposição, “Meu bem, meu mal”, é uma referência ao contexto onde geralmente acontecem os crimes: dentro do lar, diante dos filhos, na maioria das vezes, praticado pelo marido, companheiro, namorado ou ex que não aceita a separação, explica a artista, inconformada com a situação.
Livro
Além da exposição, a década de atividade da artista no combate à violência contra a mulher será marcada pelo livro de fotos das obras de “Meu bem, meu mal”. Editado no formato pocket, tem 28 páginas e um texto de apresentação escrito por Graça. Ela se diz “estarrecida, injuriada, furiosa”, com a “tragédia” do feminicídio, mas acredita que a arte pode sensibilizar pessoas com poder de interferir para a reversão do quadro. “Eu sei, a arte não pode impor igualdade, barrar o gesto nem conter o tiro. Mas quem é tocado pela arte pode”.
Trajetória
Graça Craidy, de 73 anos, já fez dezenas de exposições individuais e participou de diversas coletivas. Outra linha de trabalho importante que desenvolve une artes visuais e literatura. Montou as individuais “Clarices”, sobre Clarice Lispector e “Grande Sertão”, sobre o clássico de Guimarães Rosa, e idealizou e participou das coletivas “Autorias”, I e II, em que pintores gaúchos retrataram escritores. Ela já expôs em estados como São Paulo, Rio, Brasília; no exterior, já apresentou uma mostra individual na Itália, onde também fez cursos, em Roma e em Florença, assim como também estudou em Miami (EUA).

Crime autônomo
Em 2015, a figura do feminicídio foi introduzida no Código Penal pela Lei 13.104/2015 como qualificadora do crime de homicídio. Em outubro de 2024, foi sancionada a Lei 14.994, pela qual esse crime passou a ser autônomo, previsto no artigo 121-A do Código Penal. Com a alteração na tipificação elevou-se a pena aplicada a condenados em casos de assassinato de mulher por razões de gênero. Agora a pena varia de 20 a 40 anos de prisão.
PROGRAME-SE
O quê: exposição “Meu bem, meu mal”, de Graça Craidy
Quando: 11/02 (abertura, às 17h). Visitação até 11/03
Onde: Memorial do Ministério Público, Praça Marechal Deodoro, 110, esquina com Jerônimo Coelho
Horário: de 2ª a 5ª, das 8h às 19 h; às 6ªs, das 8h às 15h; sábado e domingo não abre.
Fotos: Divulgação da artista
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